DISCLAIMER
Este blog não tem pretenções literárias. Todos os textos postados aqui são produto de uma mente um tanto inquieta e, como tal, em constante busca de respostas para as inúmeras perguntas que teimam em surgir sem serem convidadas. Leitores que caírem, propositalmente ou não, nesta toca devem, portanto, abster-se de julgamentos de valor e tentar ler esses pequenos posts sem preconceitos...


segunda-feira, 29 de setembro de 2008

A LOUCA E EU


Tenho vivido uma crise existencial/criativa desde que iniciei esta jornada pelo mundo dos textos e da ficção. Após meses de tentativas frustradas de escrever algo que, ainda que remotamente, lembrasse um texto ficcional que tivesse qualquer valor, há algumas semanas finalmente cheguei ao diagnóstico fatal: nunca vou ser escritora, porque não tenho imaginação. Pronto!!
Até que o interessante e instigante livro de Rosa Montero - aliás, ele mesmo um amálgama entre os gêneros ficção e não-ficção - me acenou com uma possível luz sobre esse prognóstico tenebroso. "A imaginação é a louca da casa", disse Santa Tereza. E Rosa Montero se inspirou nessa frase para criar um livro que fala, entre outras coisas pertinentes ao mundo do escritor e da escrita, justamente da tal imaginação. E o que ela diz é que "a louca da casa" está em todos nós. Faz parte intrínseca do espírito humano, e vai sendo domada, cerceada e tolhida durante nossa existência de modo que possamos sentir que pertencemos à humanidade à nossa volta. Que possamos viver nossas vidas ordinárias, exercer nossos trabalhos ordinários e ter nossas relações ordinárias.
O escritor, desse modo, seria alguém que conseguiu encontrar a louca em algum lugar de sua mente e a deixou sair e se expressar. Que conseguiu sair do ordinário e criou algo extraordinário, ou seja, alcançou o tal Mundo Especial.
Essa idéia pode ser romântica, e pode não ser simples assim libertar a louca. Mas pelo menos acreditar que ela dorme dentro de mim me dá esperanças de que um dia, quem sabe, eu descubra onde ela se esconde e abra as portas da prisão para que ela saia e me enlouqueça um pouquinho. E talvez neste dia eu consiga escrever ficção. Talvez.

quarta-feira, 24 de setembro de 2008

O desejo-monstro e o cinema americano

Ontem à noite, zapeando sem muita vontade pelos canais a cabo, deparei-me com uma reprise de "Instinto Selvagem" no telecine pipoca. Após espantar-me com a estranha escolha deste canal em particular para a exibição de um filme tão perturbador, decidi assisti-lo por alguns minutos, já que não o via há pelo menos uns 12 anos e lembrava-me de que ele continha algumas cenas, assim, interessantes...
O que não lembrava era que o interessante do filme vai além das tais cenas; não sou psicanalista nem ao menos psicóloga, mas fiz (e faço) muuuuita terapia e acho que esse roteiro vai fundo em questões muito incrustadas na psique humana, em especial a do desejo como algo que devemos temer. A cena que escancara essa imagem é uma em que o personagem de Michael Douglas é despertado de uma soneca à frente da TV por um telefonema . Enquanto na tela um monstro horrível persegue a mocinha em um velho filme de terror, o nosso mocinho recebe a notícia de que seu chefe acabou de ser assassinado com um tiro. A principal suspeita? A mulher pela qual o protagonista está sexualmente atraído, num desejo que beira a obsessão. Mais claro, impossível.
O filme tem muitas viradas e, logicamente, perseguições, mentiras, tiros e assassinatos. Mas nada disso me marcou mais do que o desejo-personagem - na verdade o principal protagonista - que, como o monstro do velho filme, mais cedo ou mais tarde vai nos pegar. Seja pela culpa, pela paixão não correspondida ou por alguma doença venérea. Ou, no caso do personagem principal do filme, por golpes de triturador de gelo.
E tudo isso porque, um belo dia, alguém achou por bem distorcer as palavras de um suposto messias a fim de exercer o poder sobre nós, os pobres mortais. Acabou com nossa alegria, mas pelo menos garantiu o alto poder de entretenimento do cinema americano...

sábado, 13 de setembro de 2008

Mensagem para quem não me lê

Pergunta-se sempre aos escritores e àqueles que querem sê-lo por que eles escrevem. Mas poucas vezes se pergunta para quem escrevem. Eu mesma me faço sempre essa pergunta. Mais do que saber por que escrevo, pergunta para a qual ainda não tenho resposta e portanto me parece inútil, quero saber para quem. Mas, uma vez feita a pergunta, percebo que também para ela não tenho resposta. E que para respondê-la tenho que saber a resposta da primeira. Ou seja, estou de volta à estaca zero.
Mas, em algumas ocasiões, como hoje, sei que quero escrever para pessoas que, infelizmente, não lêem este blog. Consigo pensar em pelo menos duas delas. E o que diria a essas pessoas, se fossem minhas leitoras?
À primeira, eu diria: se você lesse este texto, saberia quanto mal me fez. Saberia o quanto eu lutei comigo mesma e o quanto "discuti com Deus", nas palavras do Chico, por sua causa. Como você virou minha vida de cabeça pra baixo, e as coisas todas caíram à minha volta e nunca mais voltaram pro lugar exatamente onde estavam antes. Nunca mais vão voltar.
À segunda, eu diria simplesmente: se você lesse este texto, não entenderia nada. E isso é muito triste para mim.
E, às poucas pessoas que vão ler este texto, eu digo: obrigada por serem minhas cúmplices. Obrigada, por me darem a certeza de que isso que sinto quando escrevo este texto não ficará só ecoando dentro de mim, para sempre sem retorno. E porque, graças a vocês, pelo menos por hoje consegui achar a resposta de por que escrevo.

quarta-feira, 10 de setembro de 2008

Almoço

Ela me disse "minha mãe foi pra Itália me trouxe uma lava-louças Prada ". Achei que ela estava exagerando, ou tirando sarro da minha cara, mas ela falava sério, como vim a descobrir mais tarde.
Um dia ela me convidou para um almoço na sua casa. Assim que entrei, vi que ela não exagerava mesmo: nunca tinha entrado numa casa tão grande ou tão rica. Salas que pareciam não ter fim, quatro ou cinco criadas, até um quarto só para suas roupas ela tinha. E eu pensava "se ficar com ela, serei rica e viverei uma vida de princesa", mas logo me arrependi de ser tão superficial. Ademais, nunca quis que ninguém me sustentasse , não ia ser agora que iria querer. Havia outras pessoas lá, amigos e familiares dela. Hora do almoço, nos sentamos, mas nem todos. Ela e algumas outras pessoas tardavam a vir para a mesa, detidos não sei por que razão. Alguns dos convidados, tentados pelas iguarias incrivelmente sofisticadas e cheirosas que já se encontravam dispostas sobre a mesa, e certamente famintos, começaram a comer. "Que falta de educação", pensei, "vou esperar até que ela e os outros estejam sentados". E esperei. Infelizmente, quando isso aconteceu e fui pegar um prato, vi que todos estavam sujos. Fui até a cozinha, onde três empregadas estavam ocupadas com a arrumação, e foi aí que testemunhei que ela tinha, de fato, uma lava-louças Prada, que mais parecia um frigorífico de tão grande. E foi lá mesmo que o prato foi lavado, pois as moças não lavavam nada manualmente.
Voltei para a mesa do almoço, onde descobri que quase toda a comida havia acabado. Os grandes camarões empanados, as codornas recheadas, os pãezinhos de todas as cores, deles nada restava. Só haviam sobrado os pratos menos apetitosos - os legumes grelhados, os cogumelos e os pães sem muita cor. Eu, que nesta altura já estava esfomeada, me servi desses mesmos, fazer o quê.
Após o almoço - o meu um tanto fraco -, ela me levou para ver o tal closet gigante, onde ficavam todas as suas roupas. Era um quarto longo e estreito, no qual grandes armários ocupavam toda a extensão das paredes laterais. Perguntei a ela se não era desconfortável ter de andar tanto (afinal, as distâncias na sua casa eram grandes) para poder se vestir. Ela disse que não. Enquanto andávamos pelo closet e ela me mostrava seus vestidos Dolce e Gabanna, suas bolsas Gucci e seus sapatos Laboutin, eu olhava para ela e pensava como era bonita. E milionária. E eu, que fui dos poucos que tiveram educação suficiente à mesa, nunca teria uma casa ou uma vida como aquelas.
Tudo bem, não saberia mesmo como operar uma lava-louças Prada. Mas adoraria um closet daqueles...